Relator vota pela equiparação da união homoafetiva estável à entidade familiar. O relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, que discutem a equiparação da união estável entre pessoas do mesmo sexo a entidade familiar, lembrou em seu voto, o ministro Ayres Britto que o artigo 1.723 do Código Civil é quase uma cópia do parágrafo 3º do artigo 226 da CF. Mas ressaltou que “há uma diferença fundamental”. Isto porque, segundo ele, “enquanto a CF nos fornece elementos para eliminar uma interpretação reducionista, o Código Civil não nos dá elementos, ele sozinho, isoladamente, para isolar dele uma interpretação reducionista”. Na sustentação do seu voto, o ministro Ayres Britto disse que em nenhum dos dispositivos da Constituição Federal que tratam da família – objeto de uma série de artigos da CF – está contida a proibição de sua formação a partir de uma relação homoafetiva. Também ao contrário do que dispunha a Constituição de 1967, segundo a qual a família se constituía somente pelo casamento, a CF de 1988 evoluiu para dar ênfase à instituição da família, independentemente da preferência sexual de seus integrantes. Ademais, conforme argumentou, a Constituição Federal “age com intencional silêncio quanto ao sexo”, respeitando a privacidade e a preferência sexual das pessoas. “A Constituição não obrigou nem proibiu o uso da sexualidade. Assim, é um direito subjetivo da pessoa humana, se perfilha ao lado das clássicas liberdades individuais”. “A preferência sexual é um autêntico bem da humanidade”, afirmou ainda o ministro, observando que, assim como o heterossexual se realiza pela relação heterossexual, o homoafetivo tem o direito de ser feliz relacionando-se com pessoa do mesmo sexo. Leia a íntegra do voto do ministro Ayres Britto.
“Agora, o texto em si do artigo 1.723 é plurissignificativo, comporta mais de uma interpretação”, observou ainda. “E, por comportar mais de uma interpretação, sendo que, uma delas se põe em rota de colisão com a Constituição, estou dando uma interpretação conforme, postulada em ambas as ações”.
Ele argumentou, também, que o artigo 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em virtude de sexo, raça, cor e que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função de sua preferência sexual.
“O sexo das pessoas, salvo disposição contrária, não se presta para desigualação jurídica”, observou o ministro, para concluir que qualquer depreciação da união estável homoafetiva colide, portanto, com o inciso IV do artigo 3º da CF.
Ele lembrou, neste contexto, que a União Europeia baixou diversas resoluções exortando seus países membros que ainda mantenham legislação discriminatória contra homossexuais que a mudem, para respeitar a liberdade e livre determinação desses grupos.
Por fim, o ministro disse que o artigo 1723 do Código Civil deve ser interpretado conforme a Constituição, para dele excluir "qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como ‘entidade familiar’, entendida esta como sinônimo perfeito de ‘família’”.