O ministro Celso de Mello ordenou, em caráter liminar, a soltura de uma mulher acusada de tráfico ilícito de drogas em Governador Valadares (MG). M.C.P.R. foi presa em flagrante em abril de 2008 com 17 pedras de crack e maconha. A decisão foi dada no Habeas Corpus (HC) 97976.
O fundamento da prisão de M.C.P.R., ordenada pelo juiz da Segunda Vara Criminal da comarca, havia sido o artigo 44 da Lei 11.343/06 (nova lei de tóxicos), que trata o crime de tráfico como inafiançável e insuscetível de liberdade provisória. Contudo, o ato de acabar com a liberdade provisória de todo e qualquer traficante, independentemente de análise da gravidade do delito, tem sido repelido pela jurisprudência do Supremo. No entendimento dos ministros da Corte, proibir de maneira absoluta a liberdade provisória afronta os princípios da presunção de inocência e da garantia do devido processo legal, entre outros.
Celso de Mello lembrou que o Tribunal teve interpretação semelhante no julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3112) que questionava a legalidade do artigo 21 do Estatuto do Desarmamento (10.826/03). O artigo dizia que a posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, o comércio ilegal e o tráfico internacional de armas de fogo eram crimes insusceptíveis de liberdade provisória. Naquela ocasião, o Supremo reconheceu a sua inconstitucionalidade.
“Todos sabemos que a privação cautelar da liberdade individual é sempre qualificada pela nota da excepcionalidade”, destacou o ministro. Segundo ele, ao obrigar a prisão do traficante, a Lei 11.343/06 também ofende a razoabilidade, que seria uma condição necessária no momento da elaboração das leis. “Como se sabe, a exigência da razoabilidade traduz limitação material à ação normativa do Poder Legislativo. O poder público, especialmente em sede processual penal, não pode agir imoderadamente, pois a atividade estatal, ainda mais em tema de liberdade individual, acha-se essencialmente condicionada pelo princípio da razoabilidade”, frisou o ministro na decisão. Por fim, salientou que “o legislador não pode substituir-se ao juiz na aferição da existência, ou não, de situação configuradora da necessidade de utilização, em cada situação concreta, do instrumento de tutela cautelar penal”, o que, em outras palavras, significa dizer que compete ao Judiciário verificar as circunstâncias peculiares de cada caso e decidir pela prisão preventiva ou não do acusado.